quarta-feira, 10 de março de 2010

Da janela da escola

Roubamos o fogo dos deuses.
Estabelecemos que o sol seja alimentado pelos filhos da desigualdade.
Sinto-me um vendedor de ilusões e de frágeis saberes.
Inventaram um cérebro artificial para ficar acoplado as nossas mentes.
Conheci, a muito tempo, o amor translúcido.
Os cães latem ao meu redor.

Permita que o silêncio invada os corredores das lojas.
Que o consumo seja trocado pelo monótomo som das palavras.
Poetas desconstruíndo o caos.

A lista de chamada é a lista daqueles que devemos fazer renascer.
As escolas estão cheias de cadeiras vazias. Kafka.
As escolas estão cheias de cabeças vazias. Calasans.
Aumentaram ainda mais a fila.

O Estado molha, irriga, as sementes da desigualdade.
O governador e sua burocracia defecam números para colocar nos rabos de suas cadelas.
As aquarelas, são amores que guardamos em nossas memórias.
Assassinamos a possibilidade de ver o outro lado de nossas vidas.
Assassinamos a possibilidades de sermos felizes.
Agradecemos os burocratas do capitalismo a bala perdida, a vida perdida e as ilusões perdidas.
Quando iremos ler As flores do mal?
Quando teremos a sensação de que um fantasma não nos segue?

Problema de física

Meu ocupado coração
perdido na lousa
quase metafísico
não resolve a equação

O grande masturbador de Salvador Dalí

Para Franz Kafka


Masturbando-se no banheiro,
do ralo,
saiu uma barata.
Chamou-a de filha.
A barata sorriu.

Enquanto a Aninha dormia

No silêncio da história,
no instante do parto,
nasceu uma estrela cadente
que iria cair no seu quarto.

Mas como iria fazer muito barulho,
para não acordar a vizinhança,
pousou lentamente, quase sem ruído,
no meigo sono da Ana, um filhote, uma criança.

A Ana, continuou a dormir, com um leve sorriso,
e eu, em delírio, observava os passos de seus sonhos,
o corre-corre em disparada atrás da estrela.
A minha felicidade, estava em poder ser e viver aventura da estrela nos sonhos da Ana.

A Ana acordou, brigou comigo.
Como a dizer: você espantou minha estrela cadente.
Era a hora de ir para a escola, pensei.

E agora, escrevo estas palavras, para que a Ana saiba,
mas não espalhe, mesmo com muita emoção,
que uma estrela cadente, pousou levemente, em seu sonho, em seu coração.

O caos do vício

O pedreiro da praça,
acha graça,
em incendiar as pedras.
Sua lógica é buscar o fim.
A alucinação é a sua construção
Ela, a alucinação, não existe.
Contido em sua mente.
Contido em sua diarréia social.
Contido em seu mórbido castelo.
A vida machucada.
A vida assassinada e assassina.
É uma pedra no meio do caminho.

quarta-feira, 3 de março de 2010

Açúcar

Ler Manuel Bandeira
Aguçar com o açúcar da história
as mentes extemporâneas dos jovens, meus alunos.
Sorrir para as nuvens.
Projetar na lua o último filme de Bunuel.

Thomas Morus

No céu da manhã
esfrego os olhos,
removo as lentes dos horrores.
Reinvento a vida, retiro as desigualdades.
Do céu caem pétalas, caem flores.

Já chorei no escuro

Já olhei para o chão com medo de pisar em formiga
Já li livros inúteis
Já sonhei com o anarquismo
Já fui feliz saboreando um doce de abóbora

Já sonhei com o Rio de Janeiro como se fosse o paraíso
Já tive medo de ficar sem os meus pais
Já chorei no escuro
Já declamei Neruda como quem descobre o sabor da vida

Já olhei para as telas de Dalí me sentindo pequeno
Já fiquei em silêncio por não comprender uma mulher
Já fui à pé, apesar de ter dinheiro no bolso
Já fumei

Já bebi álcool, cerveja, cachaça, apenas para me sentir melhor
Já escolhi andar por uma rua na esperança de encontrar um tesouro
Já tive a certeza que a chave de todas as incógnitas da vida estavam nas mentes dos cientistas e dos poetas
Já colecionei tampinhas de refrigerantes
Já sonhei com um amor em noite fria
Já dormi uma noite fria ao lado de um amor
Já aglutinei tanto amor por meus filhos que seria capaz de suportar o mundo com meu coração
Já amei Fassbinder
Já corri para comprar o último disco de Caetano
Já vivi a poesia
Já guardei meus professores na mais alta gaveta de minha alma
Já descartei os ditadores da eternidade
Já ri da filosofia
Já fiz da história minha bandeira, trêmula e alta, assim como deve ser os sonhos
Já quis ser águia, quando tinha vocação para pardal
Já roubei um álbum de figurinhas e o escondi com mentiras
Já andei na praia pensando em uma flor

Já vi estrela cadente, cachorro quente, lepra, aids, vício
Já senti a dor da fome, a estupidez do poder e o caos da miséria
Já senti as gotas da miséria em noite de chuva
Já vi Deus nos olhos de um mendigo
Já li Milton Santos como um fiel
Já gritei por Marx, Proudhon e os existencialistas

Já me senti feliz após um telefonema
Já enviei carta que nunca chegou
Já recebi e-mail que não queria ter lido
Já não tive pão

Hoje colho as pétalas que caem dos olhos das crianças.


Adilson Campos Calasans.